quarta-feira, 1 de junho de 2011

A infidelidade do romance policial

A viatura policial do 31º batalhão chegou com discrição no estacionamento do Mc Donald's, de onde Borges desceu arrastando a bandoleira de seu Colt M4 no chão, preguiçosamente. Logo, deu um último trago em seu cigarro e se dirigiu a Farias, ainda dentro do veículo:

" - Vai 'querê' um Big Mac, Farias?"
" - Não, Sargento. 'brigado'."

Borges empurrou a porta do estabelecimento com o bico do fuzil e sumiu da vista do soldado.
Parecia uma noite tranquila. Nenhuma ocorrência até então, só se ouvia o som estacado de música eletrônica ao longe, num bar qualquer, onde a burguesia refogava os valores mundanos.

Farias retirou sua boina e secou o suor de sua cabeça. A brisa da orla não tocava a Avenida das Américas. De repente uma luz sólida tomou o interior da viatura e tudo à sua volta. Um Opala preto, de vidros fumês, parou no auto-posto ao lado e desligou-se o motor. O soldado destravou seu fuzil e saiu da viatura lentamente, recostando-se na fria lataria, observando o suspeito com olhar aguçado. Uma fresta de janela se abriu no funesto carro e Farias pode contar rapidamente quatro cabeças ocultas pela escuridão. Farias moveu seu dedo indicador de forma milimétrica até o gatilho e em passos curtos, alinhou sua silhueta atrás de um poste. Dali podia-se ver Borges de costas, no interior da lanchonete de papo com a atendente sorridente, que provavelmente deliciava-se com as histórias sagazes do Sargento.
O Soldado sentiu o que em anos de serviço não vivenciava: a sensação de vida por um fio. O Opala deu partida no robusto motor 4.1 e uma névoa branca tomou suas linhas uniformes. Em seguida arrancou bruscamente fazendo com que os pneus traseiros emitissem um choro lancinante ecoado nos lotes lindeiros da Avenida. Farias não pensou duas vezes antes de saltar por cima do capout da viatura, caindo do outro lado já em posição de assalto. Ao cortar o ângulo de combate, o soldado pôde ver os bicos de dois fuzis apontados em sua direção. Foi nesse momento em que Farias contou seus supostos últimos segundos de vida e por algum motivo desconhecido se deixou levar, recolhendo seu dedo do gatilho, seguido pela mão e em seguida, fazendo um sinal da cruz. Ele tentou fechar os olhos, mas um sentimento de medo mesclado com uma tácita coragem não permitira. Através de luzes borradas, Farias viu o carro tomar distância, ouviu as quatro marchas sendo engatadas gradualmente até que o som maquinante destoasse em seus ouvidos. O alívio do soldado durou apenas dois segundos até que se pôs de pé - com as pernas ainda trêmulas - e correu até a Lanchonete. Chutou a porta com veemência e bradou:

" - SARGENTO! Veículo suspeito em fuga, quatro ou cinco indivíduos possivelmente armados!"

Borges olhou-o boquiaberto, com um pedaço de alface nos dentes.

" - Em fuga de que, soldado?"
" - (...)"
" - Eles pararam no posto e saíram em retirada sentido Barra!"
" - (...) E daí?
" - (...) E daí nada, Sargento."

Todas as pessoas do recinto olhavam, paralisadas. O picles do hamburguer de Borges caiu no chão.

" - Num fode, Farias. Deixa eu comer meu Big Mac em paz, porra."

Um comentário:

  1. Pois é...
    Num final de semana passado, eu estava na sinuca de madrugada, quando chegou uma ambulância com a sirene ligada, em alta velocidade...
    Pensei que alguem estivesse tendo um ataque por alí...
    Entao o motorista desceu da ambulância e foi comprar hamburguer e cerveja...

    fiquei sem saber o que fazer na hora...deveria rir ou chorar...?
    õ.Ô

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